Quando duas pessoas divergem em relação a contratos que firmaram entre si, recorrem a advogados que, por sua vez, defendem seus clientes recorrendo ao que chamamos de DIREITO CIVIL. Quando duas nações divergem em relação a determinadas questões e não querem guerrear entre si, recorrem a árbitros ou tribunais internacionais que balizam suas decisões no chamado DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO. Na Teoria dos Contratos, há um princípio de direito que diz que quando uma das partes tem a sua liberdade de contratar maculada, o contrato é considerado nulo automaticamente, tal como alguém, sob chantagem ou a mira de um revólver, assina um documento que, em situação normal, jamais o faria. No Direito Internacional Público existe o conceito de DÍVIDA ODIOSA que, para ser declarada, exige três requisitos principais: 1) Contratação de empréstimos pelos governantes sem o devido conhecimento de seus cidadãos; 2) Gasto do valor em áreas que não beneficiam seus cidadãos ou que visem meramente reforçar o regime; e 3) Conhecimento da situação referida em 1 e 2 pelos credores.
Para contrair os empréstimos que elevaram as dívidas da Grécia para o patamar de insolvência do estado, o governo efetivou contratos que, sob vários pontos de análise, atendem aos requisitos de nulidade, ilegalidade e odiosidade mencionados acima. Fundamentados nesse princípios jurídicos deputados gregos de oposição reivindicam uma AUDITORIA PÚBLICA DA DÍVIDA com o fim de historicizar e detalhar a constituição e evolução da mesma. Onde houver ilicitude, defendem eles, deve-se declarar a nulidade dos valores contratados e a abertura de processo criminal contra os responsáveis. Há casos, por exemplo, de empréstimos´concedidos com contrapartidas a priori, ou seja, condicionadas à compras obrigatórias de armamentos de empresas do país concedente. Importante mencionar que o instituto da DÍVIDA ODIOSA, recentemente, foi reivindicado e reconhecido internacionalmente em relação a dois países: Equador, depois da posse de Rafael Corrêa, e EUA, em relação às dívidas do regime de Saddam Husseim. O Banco Central Europeu, o FMI e o governo grego se fingem de surdos diante de tais propostas e insistem nas medidas que punem severamente o povo grego. E já que falamos nas malditas, destaco algumas delas nas linhas abaixo:
1.25% de redução imediata nos salários do funcionalismo e congelamento dos mesmos por tempo indeterminado;
2. idem para os trabalhadores do setor privado;
3. redução drástica dos gastos públicos em saúde e educação;
4. aumento geral da carga de impostos;
5. demissão de parte considerável do funcionalismo;
6. elevação da idade de aposentadoria;
7. amplo programa de privatização (portos, aeroportos, água, energia elétrica, propriedades públicas, etc).
Se tais medidas forem efetivadas, na prática, elas representarão a captura quase completa da Grécia pelos órgãos financeiros da Zona Euro e, pelo que se percebe, a elite grega é cúmplice desse projeto. Numa situação muito parecida estão também Portugal e Irlanda, muito provavelmente, as próximas vítimas desse processo de captura e anexação de economias menores pelas maiores. Tivesse o Brasil caído no esparro da ALCA tempos atrás, é bem possível que estivéssemos numa situação talvez até mais vexatória que a da Grécia de hoje. Mas que arregalemos bem os nossos olhos, pois, tal como os brasileiros de hoje, os gregos, há 11 anos atrás, estavam eufóricos diante dos jogos olímpicos que iriam sediar alguns anos depois. Quando anunciados, os jogos custavam 20 vezes menos do que de fato custaram aos contribuintes gregos. Na iminência da aprovação de um regime diferenciado de licitação para apressar as obras da Copa do Mundo e das Olimpíadas, o Brasil pode também estar dando alguns passos em direção ao cadafalso. Eles sempre dizem que, depois da festa, o povo vai ser beneficiado pelas obras que ficarão para proveito público. As grandes perguntas que não querem calar são: ISSO ERA PRIORIDADE PARA O PAÍS? Não seria melhor investir essa fábula de dinheiro em nossas caóticas redes públicas de saúde e educação? AQUI, TANTO QUANTO NA GRÉCIA DE HOJE, o parlamento se faz de surdo diante das vozes que vem das ruas.
Que, pelo menos, nosso futuro não seja tão duro quanto está sendo para nossos irmãos gregos.
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