Política e Religião: irmãs perdidas no novo tempo

   
         Diz o ditado popular que não se deve discutir "religião", "política" e "futebol", pois o apego apaixonado ao próprio ponto de vista inviabiliza qualquer diálogo sincero e honesto entre os que discutem e, não raro, descamba pro desrespeito e pra violência gratuita. Assim é de fato quando os que discutem não estão dispostos ao diálogo, mas a simples imposição de idéias e opiniões aos demais. Sem essa predisposição à imposição, qualquer tema é passível de um diálogo franco, honesto e, sobretudo, pacífico. É no diálogo e relacionamento com os outros que o ser humano tem a possibilidade de avaliar e repensar conceitos e idéias há muito arraigadas e, exatamente por isso, não sujeitas a análises e revisões periódicas. Dizia o saudoso Raul Seixas, numa de suas músicas famosas, que preferia ser uma "METAMORFOSE AMBULANTE", ou seja, absolutamente aberto a mudanças de posturas e opiniões ao longo da vida e é nesse aspecto, penso eu, que reside o problema da dificuldade de diálogo no campo da política e da religião.
   Nesses campos há uma forte tendência ao conformismo com realidades há muito existentes e tidas como "naturais" e "não mais passíveis de mudança". Vem daí frases do tipo "É assim mesmo" ou "Não tem jeito, isso sempre foi assim e sempre será!". Essa tendência ao conformismo no campo da política e da religião é algo extremamente nocivo na medida que vai no sentido contrário da natureza original de ambas. O que é a política para além da necessidade de um diálogo continuamente livre e aberto que possibilite o aprimoramento da vida em sociedade, ou seja, de um mundo melhor pra todos? Resposta: conservadorismo medíocre, arrogante, autoritário e injusto socialmente. Quando se tenta fazer da política um instrumento para manter quase tudo do jeito que está,  ela é desviada de sua razão de ser. Esse é um dos aspectos centrais da crise do mundo atual, visto que o sistema econômico dominante se esforça ao máximo na confecção de todos os tipos de amarras para ela, visto que, livre delas, cumprirá plenamente com o seu papel.
     A religião, esforço crescente para maior proximidade do humano com o divino, também padece do mesmo mal que a política, sua irmã mais nova. Vejo-as como irmãs porque ambas concebem o mundo a partir de uma ordem que entendem necessária. Toda ordem em si não é má, visto que nenhuma sociedade funciona sem uma. O problema começa quando a ordem busca ter vida própria, ou seja, negando a sua transitoriedade como mecanismo de ordenamento, posto que nada existe sem ser passível de aprimoramento. A religião, quando fecha-se em si mesma e passa a se ver como fim e não meio, também se desvia de sua razão de ser. Quando se afirmam como conhecimento não mais passível de aprimoramento, as religiões negligenciam o caráter de incompletude que caracteriza a relação do humano (limitado) com o divino (ilimitado). Nesse sentido, penso que as religiões rejuvenesceriam bastante se adotassem a mesma metodologia da Filosofia e da Ciência, que, apesar da construção de verdades aceitas e professadas, nunca se fecham para a possibilidade de uma reconstrução das mesmas.
        A política e a religião precisam se reconciliar com o tempo presente para que possam inspirar fé e esperança em relação ao futuro e não mais contribuir para o reforço do conformismo e desilusão com a realidade que está posta.

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