O índio, a caça e os caçadores

Paulo Apurinã, conhecido ativista de movimentos sociais do Amazonas, está preso, desde o último dia 28.02.14, sem que ninguém saiba ainda o motivo de sua prisão. Um dia antes, ele divulgou, na internet, um vídeo polêmico em que um empregado de Adail Pinheiro cita o nome de altas autoridades nos escândalos de Coari.

Por Fernando Lobato_Historiador

Paulo Apurinã é um índio que nasceu desgarrado de sua tribo. E índios desgarrados são vistos sob um duplo olhar preconceituoso. Para os “civilizados”, eles são índios falsos porque, segundo seu ponto de vista, índio verdadeiro não vive fora da aldeia, não usa fone celular nem computador, não acessa a internet e nem calça tênis de marca. Para os índios ditos “primitivos”, o índio urbano é também um índio de valor inferior porque, ao viver desgarrado, está cedendo aos “encantos” da vida dita civilizada e contrariando a vontade de seus antepassados.
Paulo Apurinã, para além dos preconceitos do “civilizado” e do “primitivo”, tornou-se um homem alto, forte e falastrão. Aonde vai não passa despercebido, pois é daqueles que fala tudo o que pensa e, por conta disso, faz muitos amigos e também desafetos. Paulo Apurinã viveu sempre dividido entre os dois mundos que o olham de forma preconceituosa, mas não renegou nenhum deles. No mundo de seus ancestrais, busca desenvolver uma nova consciência em defesa de seus direitos, sendo um dos líderes de um Movimento Indigenista de Reflexão - MIRREAM. No mundo dos “civilizados”, estudou e buscou compreender a lógica deste e, por fim, cursou universidade e graduou-se em GESTÃO PÚBLICA, tendo sido o orador de sua turma.
A vida de Paulo Apurinã seguia como segue a vida da grande maioria dos que vivem no mundo dito civilizado, ou seja, era mais um desconhecido no meio da multidão. Quando passou a destacar-se na militância de vários movimentos sociais, chamou a atenção de membros da “corte real amazonense”. Corte que ignora as mudanças que o tempo produziu e que teima na crença de que Estado Democrático de Direito é besteira porque o estado sempre existiu e sempre existirá para defender os interesses tanto da nobreza quanto dos ricos burgueses a ela associados.
Na concepção de estado da “corte real amazonense”, a Justiça deve ser fiel à tradição do ABSOLUTISMO MONÁRQUICO, ou seja, é um poder atrelado à vontade real. Basta uma palavra e os súditos desleais são logo trancafiados nas masmorras do regime. Já tem algum tempo que Paulo Apurinã tornou-se um desses “súditos desleais”. Já faz também algum tempo que vem sendo difamado, caluniado e ridicularizado por um dos “príncipes da corte real amazonense”. Um “príncipe” que se especializou na arte da mal-querência com os inimigos da “monarquia” e até ganhou concessões de rádio e TV para cumprir bem seu papel.
Paulo Apurinã chegou um dia a acreditar que a justiça dos “civilizados” funcionaria melhor que a de seus antepassados “primitivos” e até peticionou contra o “príncipe” que lhe atormenta a vida. Acusou-lhe de injúria e difamação, mas nada aconteceu. Pouco tempo atrás, Paulo Apurinã descobriu que esse mesmo “príncipe” é réu num processo que coloca enormes suspeitas sobre sua “honra e integridade”. Processo conduzido pela Polícia Federal, ou seja, por não submetidos à “corte” local. Paulo Apurinã não perdeu tempo, espalhou logo a notícia e, em face disso, foi logo processado pelo “príncipe”.
Paulo Apurinã, para além de militante nas causas indígenas, é também militante social em questões de moradia popular e reforma urbana e, recentemente, passou também a engajar-se no Movimento Contra a Pedofilia. Quase uma semana atrás, divulgou um vídeo onde um suposto empregado de Adail Pinheiro fala demais ao citar  nomes de altos membros da “corte real” no esquema de Coari. Um dia depois, Paulo Apurinã foi trancafiado na masmorra do regime e lá permanece até o dia de hoje. Nenhum familiar foi informado ou sabe dizer por qual motivo ele está preso e nós também queremos, a sociedade que não reconhece a vigência do Absolutismo. Os advogados locais, quando tomam conhecimento de contra quem irão advogar, despistam e arranjam desculpas para não assumir a causa. Enquanto isso, Paulo Apurinã, o índio que ainda não aprendeu direito a caçar, virou caça aprisionada do homem branco.
      Familiares da “caça aprisionada” dizem que o “príncipe” que o atormenta fez-se presente junto com os agentes da “ordem”. Já sabemos que o índio virou caça dos ditos civilizados, mas ainda é preciso lançar mais luzes sobre a identidade de todos os caçadores. Alguém arrisca um ou mais palpites?

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