A foto é uma ilusão: quem manda não usa a faixa |
Por Fernando Lobato_Historiador
A História do
Brasil é testemunha de que, com breves e raríssimas exceções, sempre fomos
governados de fora para dentro. Entre 1500, ano da chegada de Cabral, e 1808,
ano da transferência da metrópole para o Rio de Janeiro, nossa sorte era
decidida lá em Lisboa. Decidido nosso destino lá, Governadores-gerais, Capitães
Donatários e outros subordinados do rei se estabeleciam aqui dentro para impor,
do alto para baixo, a produção de riquezas que fazia a vida doce e confortável
tanto para quem dava as ordens lá de fora quanto para quem as executava aqui
dentro de forma indireta, visto que o trabalho concreto que produzia as
riquezas era obtido de indígenas e africanos escravizados. Eram eles que produziam o
açúcar, o algodão, o tabaco e que extraiam o ouro da terra com as próprias
mãos. Foi com o suor e o sacrifício da vida destes que se constituíram as
grandes fortunas privadas desse país, mas, para os quais, restou apenas o
preconceito, a discriminação e o descaso daqueles que sempre os exploraram e
governaram. Os interesses do mercado capitalista em expansão– que governa o
mundo desde o século XVI- aqui sempre
foi imposto de forma cruel, injusta e impiedosa.
O Brasil de
2019, fiel à lógica que sempre nos governou, tem seu destino hoje decidido não
em Brasília, mas em Washington. Não somos mais dirigidos por um governador-geral
como no tempo do domínio português, mas por um presidente de algo que nunca foi
de fato uma república, ou seja, propriedade do povo. É verdade que temos
eleições, mas quem é eleito, muito raramente, mantém e cumpre compromissos com quem
os elege, mas sim com quem, mesmo sem mandato, manda neles. Eis porque, quase sempre, nunca é a melhor
proposta de governo ou o candidato mais qualificado que vence uma eleição, mas
sim aquele que mais recebe dinheiro por
baixo do pano para comprar votos e influenciar a opinião da maioria.
Estamos longe, muito longe, do nível de exigência e pressão cidadã, por
exemplo, exercida pelos franceses sobre quem os governa. Macron que o diga,
acossado há mais de um mês pelos coletes amarelos (ver aqui). Embora Bolsonaro tenha
recebido o mandato das urnas, não é ele quem governa de fato e sim quem o
interesse do mercado internacional confiou o exercício do poder, ou seja, o
banqueiro Paulo Guedes, Ministro da
Economia.
Uma prova de
que Guedes é o chefe maior da hoje República das Bananas Brasilis se deu na semana
passada. Onix Lorenzoni, Ministro da
Casa Civil, veio a público informar que o presidente havia se “equivocado” ao
dizer que haveria aumento no IOF
(Imposto sobre Operações Financeiras) e que a proposta de reforma da
previdência previa idade mínima de 62
anos para homens e 57 para mulheres (ver aqui) - mais suave que aquela que Temer e Meirelles, o último presidente de
fato, tentaram nos impor goela abaixo. É
bem provável que Bolsonaro tenha levado um pito do chefe maior para não ficar
abrindo a boca igual a Ofélia, mulher do Fernandinho, personagem de Lúcio Mauro
em programas humorísticos (ver aqui). O
que chama atenção é que se tratava de boas medidas, visto que o aumento do IOF suavizaria
o déficit fiscal com dinheiro do andar de cima e a idade mínima menor diminuiria
a resistência popular contra a reforma da previdência. Diz o ditado, porém, que
manda quem pode e obedece quem tem juízo e Bolsonaro, não querendo ter Guedes e
o mercado como inimigos, calou a boca desde então. Dias depois, para mascarar
um pouco sobre quem manda em quem, disse em público que sabe mais de política
do que Paulo Guedes (ver aqui). O seu anúncio “equivocado” demonstra de fato
isso, mas quem manda não é quem tem a faixa presidencial, mas quem dirige a
economia, ou melhor, quem manipula a arena econômica para favorecer o interesse privado em desfavor do interesse público.
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